Colocar os olhos na janela e contar luz por luz, um mar de luz, rios desconexos de luzes sempre é como um imã. Coloco os olhos nas luzes, no vazio e prevejo a queda. Ainda que ela nunca aconteça. A sensação de morte imediata nasceu com a minha espera. Sou mais um bobo sentado na cadeira da espera pelo que tenho saudade de jamais ter tocado. Sou mais uma espera.
Paro na fila antes de pegar o transporte coletivo e sou cercada de rostos que encontraram. Eles gritam com os olhos, com as mãos: “Que você continue na espera. Assim é que é”.
Eu sempre pedi sonhos em segredo porque eu sabia que a realidade entendia palavras ditas baixinhas. De uma sala a outra, eu fui transferida, sempre na promessa cega de que sonhos em segredo era exatamente a linguagem de deus.
Deus ouviu calado. Mas os homens não entendem a linguagem de deus e julgaram que eu não tinha sonhos.
Vesti-me com as roupas da luta e empunhei a arma que me coube. Fiz questão de dizer ao mundo que era serva da realidade, que de sonho eu era imune, graças a deus.
E vivi os dias assim: empunhei armas de todos os tamanhos e cores, fiz questão de percorrer meus iguais, meus tetos, convencendo-os de que eu era imune. E quem viesse comigo, viveria uma existência imune.
E sou uma fraude. Sempre fui uma fraude mal feita, pele e roupas e sonhos em segredo.
E sou uma fraude. Sempre fui uma fraude mal feita, pele e roupas e sonhos em segredo.
Clarice contou pra mim quando passei semanas G.H. e sua paixão: “Toda a minha luta fraudulenta vinha de eu não querer assumir a promessa que se cumpre: eu não queria a realidade”. E assim eu me assumo.
De tanto treinar, os sonhos secretos surgem sozinhos. Engasgo com alguns deles. Já pensei que morreria afogada de (em) segredos.
O antídoto está na realização do sonho, mas meu palpite é que deus faz gente para ocupar cadeiras. E não me julgue pela conformidade. A desistência pode ser um prêmio.
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