domingo, 1 de agosto de 2010

Jaz(z)


Foto: Leap into de void - Yves Klein


Solto o dedo no enter e o jazz me faz voltar ao que não existe mais.
Aquela casa ampla, azulejos amarelados, um quintal no fundo. Aquelas festas, salada na mesa, o brigadeiro escondido sobre a geladeira. E a geladeira era alta demais. Era alta demais.
O quartinho de despensa, as escapadas escada acima. Sempre fui de escapar escada acima, escada abaixo, portas e janelas. O que me alimentava era o perigo de ser pega. “O que direi se souberem que estou aqui, em território proibido?”.
Era colo de tia, palavras com pouco sentido. Um cafuné, cheiro de bexiga.
Lembro também que, vez ou outra, abria a porta e caminhava, sozinha, rumo ao portão. Ao alto dos meus oito, dez anos, e toda uma complexa teia de pensamentos, reservava aqueles momentos para, totalmente sozinha, olhar para o céu. Eu procurava estrelas. Procurava um ouvido.
Sozinha, eu sentia companhia.
E desta sensação, termino preenchendo partes que me faltam. Sozinha, parece, me faço companheira. Sozinha não explico, não faço sentido, não preciso parecer compreensível. Sozinha, gosto de azul, de rosa, sou princesa e espio pornografia. Sozinha, acredito e faço pouco da paixão. Companheira dos meus dias, trancafiada em um quarto, creio no que me faz crer. Imagino amores, imagino castelos, imagino uma praia. Batalhas, guerreiros e um pouco de futuro.
Sozinha, isso tudo nunca foi mentira.

Um comentário:

Teste 1984 - Martinaitis disse...

Nada como um Jazz para mexer com as lembranças, né?