quinta-feira, 26 de junho de 2008

Àquele ato

Hoje seus pés formigaram. Os dedos tortos não eram comuns. Imperfeito, pensou. Eles formigavam, queriam dizer-lhe algo. Sabia que aquele dia frio de junho não passaria despercebido. Algo soprava-lhe ao ouvido. E assim se fez.
Uma manhã comum, a mesma dor no estômago, ânsia, as mesmas vistas desfocadas. Mas, não. Aquele dia seria diferente. E assim se fez.
A rotina, a mesma prece, idéias, trocas de explicações esperançosas de algum sentido. Mas não. Não havia sentido.
As cores brilhavam com uma inconstante intensidade que, ora cegava, ora levava a um nirvana momentâneo, segundos de uma psicodelia única.
Inóspitas obrigações, inóspitas companhias depois, engoliu a comida sem gosto, sem fome, sem impulso, desencorajada.
As horas arrastaram-se. Uma despretensiosa conversa enunciou-se como a adição orgástica a tempos inférteis. Ainda que pouca e rasa. Orgasmos virginais.
Em dias sombrios, desconexos, desmascarados, desonestos, gota d’água mata a sede.
E naquelas letras, encontrou abrigo, cobertura frágil, mas morna. Naquelas letras, lembrou-se de quem foi num ontem inexistente, mas tão vivo em sua memória quanto o almoço, parado na boca do estômago ainda dolorido.
Certeza não há. Talvez uma seqüência de imagens excessivamente poéticas. Talvez um amontoado de desejos medíocres buscando um instante de glória. Talvez o início de uma verdade revelada a poucos, aos poucos... dolorida, rançosa, mas deliciosamente elucidativa.

Agora, o sono resolveu-se andarilho noturno. Delírios inspirados, doentios, não importa. Mas os pés ainda formigam.

2 comentários:

Vinícius Castelli disse...

E o que carregamos sempre, são nossas memórias e o que deixamos sempre, é a saudade nas outras pessoas.
"Em dias sombrios, desconexos, desmascarados, desonestos, gota d’água mata a sede"
E ainda assim, os vitoriosos conseguem encontrar uma gota d´água.

Parabéns.

Anônimo disse...

Se os pés ainda formigam é um ótimo sinal. O sangue ainda circula quente, trazendo vida.
Vida essa que sempre se revela aos poucos. Frágil, morna, mas em movimento.
Amo sua capacidade de se renovar e as mil pessoas que vc já foi e ainda será nesta vida. Amo-te amiga! Porque és uma das poucas pessoas que valem a pena na minha lista de telefones do celular :)
Um beijo